Praticalidades para Sair do Armário. Só que não! por Cassiano Soares Lopes

Com grande orgulho, mais uma coluna pelo amigo do Salotto, Cassiano Soares Lopes

Praticalidades para Sair do Armário. Só que não!

Por Cassiano Soares Lopes

Um leitor do Consueloblog, no post De quem NÃO é a culpa?… Falando de Orlando e LGBT, expressou a satisfação de encontrar no Salotto o respeito ao it’s ok to be gay (tudo bem ser gay) a ponto de revelar sua verdade e inspirar o próximo texto – Sair do Armário (assumir ser gay).

Desde o início dessa parceria, escrevo de forma simples em textos transparentes, leves e verdadeiros sob a ótica de experiências e percepções pessoais que, quando contadas, esclarecem e ajudam pessoas. Apesar de sempre tomar partido, aprendi a ser imparcial, o que talvez deixe meus textos menos profundos e freudianos. Tento não ser repetitivo, mas conforme o tópico, é inevitável. Adoro escrever a coluna porque reafirmo a cada parágrafo a felicidade por ser quem sou.

A primeira reação à descoberta de ser gay é um mix de incerteza, desespero e alívio. Para mim, algo normal e que não deixa de ser reflexo involuntário do preconceito enfrentado em inúmeras situações. A tensão pré-contar que sou gay aflige, mas é o momento da libertação para quem vive em reclusão de identidade e deve acontecer.

Como em toda revelação, existem questionamentos. É preciso se tornar um ghostbuster (caça-fantasmas) e combater os monstros. O momento da verdade é crucial e quem deve enfrenta-lo sabe quando fazer isso. Comigo foi em etapas. À cada fase vencida, me sentia mais confiante até que encontrei o momento certo da revelação completa. Ao longo do processo, as dúvidas permanecem. Algumas são comuns e outras individualizadas. Apesar da história ser a mesma, as incertezas e reações são isoladas e então elenquei algumas inseguranças atormentadoras e o que penso sobre elas.

Para quem eu conto primeiro? Quando eu conto? Para quem se sentir confortável, pois não há uma regra. Uns contam para os pais, outros para os amigos. Cada um sabe para quem abrir seu coração, em quem confiar. O importante é ter apoio e seguir em frente. Hoje em dia está mais fácil falar sobre orientação sexual, mas é difícil para muita gente que ainda prefere manter segredo. A decisão cabe à cada um. Quando contar, depende também. O momento certo é o seu momento. Particularmente, acho que quanto mais cedo melhor.

Meus pais vão me matar! Sem dúvida é a preocupação máster. Contar para os pais é um mal necessário. São os únicos a quem de fato devemos satisfação, mesmo desconhecendo sua reação, pois o filho ao se revelar, teme ser rejeitado e a incerteza é parte do contexto. O importante é tirar tal pensamento da cabeça. Os pais, em sua maioria, já sabem que o filho é gay e cabe a eles a decisão de conviver com a realidade ou deixar para lá, como também acontece. É uma procrastinação de algo que vai acontecer a qualquer hora. Reafirmo que quanto mais cedo a revelação for feita, menor o sofrimento e maiores as chances de uma vida feliz. Conheço pessoas que vivem internalizadas no segredo com medo de assumir a verdade. Tento, da melhor forma, incentiva-las e apoia-las para que se libertem. Mas não tenho o direito de obriga-las porque o timing é diferente para cada um.

É tudo minha culpa… quero morrer!?! Muita gente se sente culpada e atitudes extremas, como o suicídio, acontecem… inclusive pais se cobram e não se perdoam pelo seu filho ser gay. O pensamento de “onde errei, o que eu fiz” precisa mudar e junto com ele entender que não há culpados nessa história. Em minha opinião o sentimento de culpa existe quando fazemos algo errado, o que não é o caso. A orientação sexual é da natureza do homem.

O que meus amigos e parentes vão dizer de mim? Quem te ama de verdade abrirá os braços para reafirmar o respeito e cumplicidade entre vocês. Agora, se o comportamento mudar, começarem a se afastar e fazer piadinhas de mau gosto, “zarpa”! Essas pessoas não merecem sua consideração. Não passei por isso, mas sei que acontece. Uma solução? Ignorar e bola para a frente.

Será que vão me demitir porque sou gay? Não vão e não podem. As demissões ocorrem por desvios funcionais, redução de quadro ou não cumprimento de normas, entre outros motivos, mas não porque alguém é gay. As empresas adotam políticas de ética ou códigos de conduta para zelar pelo bem-estar do empregado. Se isso acontecer, é preconceito e pode resultar em uma ação judicial.

Odeio quando me chamam de viado, bicha, etc. Acho esses termos ofensivos e não gosto. O mesmo para chamar homens gays pelo nome feminino e mulheres lésbicas pelo masculino. Oiiiiii Cassiana! Fala aí Paulão! Argh! Não sei se é por superexposição ou por personagens gays estereotipados de filmes e seriados, mas viado e bicha viraram jargão. Viado! Que calça linda! Nossa, arrasou bi! Parece que virou moda. Mulheres se referem a mulheres usando o termo viado!?! E muitos gays fazem isso também… será que sou antiquado? O que vocês acham? Me perdoem, não entendo e se alguém se referir a mim dessa forma em algum momento vou me manifestar.

Meu Deus, sou pecador. Falar sobre homossexualidade e religião é delicado e não me sinto à vontade porque a conversa, dependendo da pessoa com quem você compartilha, fica pesada. A intolerância e fanatismo religioso fortalecem o preconceito e, até onde eu entendo de religião, não foi o que aprendi. Os ensinamentos de fé e crença independem de raça, cor, orientação sexual e afins. São sentimentos de alma, de coração, de respeito à criação. “ Somos todos pecadores até que alguém atire a primeira pedra. ”

O que acontece se as pessoas zombarem de mim, me agredirem verbalmente e fisicamente? Quais são meus direitos enquanto cidadão? No caso da zombaria, ignorar é a melhor resposta. Agora, se a situação ficar mais séria ao ponto de acontecer uma agressão, o correto é procurar pela polícia e fazer um boletim de ocorrência. Infelizmente, o número de casos de agressão contra homossexuais tem crescido no Brasil. São dados que devem ser levados em consideração para a criação de uma lei que defina a homofobia como crime, pois conforme o site www.guiadedireitos.org “a Constituição Federal brasileira não cita a homofobia diretamente como um crime. Todavia, define como objetivo fundamental da República (art. 3º, IV) o de promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, ou quaisquer outras formas de discriminação.  É essencial ter consciência de que a homofobia está inclusa no item “outras formas de discriminação” sendo considerada crime de ódio e passível de punição. Através da Lei Estadual 10.948/2001, o estado de São Paulo estabeleceu diferentes formas de punição a diversas atitudes discriminatórias relacionadas aos grupos de pessoas que tem manifestação sexual perseguida por homofóbicos e intolerantes. Atualmente está em tramitação no Congresso o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 122/2006 que tem como proposta a criminalização da discriminação gerada por diferentes identidades de gênero e orientação sexual. Se houver ofensa verbal, fundada na condição de homossexual, pode configurar o crime de injuria e também podem ser tomadas as providências criminais cabíveis, ou seja, uma ação penal privada, que tem início pela queixa do ofendido. Leia o texto da lei do crime de injuria, que está no art. 140 do Código Penal (obrigado Dany Cilento pelos esclarecimentos!):

Art. 140 – Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa.

• 1º – O juiz pode deixar de aplicar a pena:

I – quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;

II – no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.

• 2º – Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.

• 3^o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

Pena – reclusão de um a três anos e multa. (Incluído pela Lei nº 9.459, de 1997)

O que os políticos podem fazer em relação à causa LGBT? Política é outro tema de discussão delicado dependendo da contraparte, mas tenho convicção quanto ao papel dos governantes: definir e estabelecer leis/ações que sejam exercidas em benefício de uma sociedade igualitária em relação aos direitos humanos de todos os cidadãos, inclusive dos LGBTs. Apesar do caos político que vivemos em nosso país, acredito na existência de representantes capazes de implantar tais mudanças e melhorias sociais.

Compartilhando essas informações espero poder ajudar outras pessoas em seus processos de descoberta e libertação. Sejamos a nossa verdade sempre!

Obrigado mais uma vez Super C por abrir o espaço do Salotto em prol do amor e respeito.

Beijocas e abraço de urso!

Cassi